quinta-feira, 15 de maio de 2014

A FORÇA CONSTRUTORA E DESTRUIDORA DAS PALAVRAS



“As palavras não têm a ver com as sensações. Palavras são pedras duras e as sensações delicadíssimas, fugazes, extremas.”
Este fragmento de Clarice Lispector fez, hoje, um sentido excepcional e tenho sido perturbada nestes últimos tempos por ele. Como sentir na pele a dureza das palavras e aprender a processá-las de forma acolhedora? Sentindo todo sofrimento cabível e realizando um esforço para proceder à compreensão do contexto sem permitir que as sensações “delicadíssimas” e “extremas” te paralisem?
A cada dia nossa dualidade se mostra, e nossa decisão de se construir um ser melhor é colocada em xeque. Mergulhar na dor da dureza das palavras e extrair delas o núcleo sadio, para que as sensações delicadas se tornem mais bem elaboradas, de extremas, se tornem equilibradas é tarefa lamentosa e complexa. Exige de nós recolhimento, reflexão, sofrimento, meditação. Muitas perguntas, muitas indagações...
Vem um lampejo da culpa judaico-cristã, que me persegue, e que o processo terapêutico tem minimizado, encontro aí no núcleo são da minha loucura, a possibilidade da minha fragilidade de comunicação reverberar no ambiente e trazer estas pedras duras e destrutivas, eu criando a possibilidade da destruição com minha inabilidade face ao mundo.
Trago a dor intensa de Clarice para utilizá-la como advogada de minha própria dor e melancolia. “Só os vira-latas me entendem”, quando li, reli e sorri, identificação total. Os vira-latas aceitam o que lhes é ofertado e entendem com a fidelidade dos sentidos que foi dado o possível, o que se podia oferecer. E alegres, abanam o rabo, definitivamente busco ser o vira-latas da Clarice, com meu metafórico rabo do esforço supremo no entendimento, que busco intensamente, sofregamente...
Clarice também me ensina enfaticamente: “calar-se é nascer de novo”, isto eu entendo mais com a razão do que com a ação, tanto que estou aqui na antítese do calar, expressando publicamente minha amargura, me recusando ao “nascer de novo” próprio do silêncio. Busco  o silêncio e a calmaria com lupas de alto nível que encontram barreira na minha miopia de alto grau.
Lanço mão das palavras construtoras de Clarice, para que venham ao meu auxilio e me amparem para extrair o que de bom posso tirar do destrutivo que encontro nas palavras manifestas.
Afundada em meu sofá mais ou menos confortável me vem a inspiração, e mesmo sem inspiração desejo expandir e dizer o que hoje eu sinto. Que bom que “fugazes” aparece nas palavras, e estas sensações irão se dissipar com o vento que tem todo poder de levar para bem longe, deixando apenas as lições no fundo da alma inquieta e sofrida, que se constrói a cada dia com as pedras duras que recolhe no caminho. Tenho fé em meu poder de transmutação, sou camaleoa, mutante e desenfreada.
Para finalizar trago mais uma vez o aporte delicioso dela,  minha musa, a quem chamei todo tempo neste discurso pé de chinelo roto e cansado. “Não se escreve para a literatura, escreve-se para cobrir um vazio, vencer a descontinuidade.” Pronto! Clarice, é isso mesmo! Hoje tagarelo em toques digitados para cobrir o vazio deste momento e para romper a descontinuidade com uma nova descontinuidade e agora calar.

2 comentários:

  1. MUITO BOM O TEXTO TERESA... A MAGIA DE CLARICE EM SE EXPRESSAR MESMO QUE MUITOS NÃO A COMPREENDAM, MESMO QUE PARA MUITOS NÃO FAZ O MENOR SENTIDO. MAS O ADMIRÁVEL É EXATAMENTE A CORAGEM DE CONTAR SUA VERDADE PESSOAL.

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  2. Imagina que só vi esse Belo comentário hoje quando lembrei desse texto que hoje me reflete. Gratidão!

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